Por: Ronaldo Antônio Linares
Pres. Da Assoc. Umbandista do Grande ABC
Texto publicado no Jornal U&C, nº 92, Dezembro de 1995.
Quando do primeiro contato de Ronaldo Linares com Zélio Fernandino de Moraes, este lhe narrou como
tudo começou.
Em 1908, o jovem Zélio Fernandino de Morais estava com 17 anos e havia concluído propedêutico (equivalente ao segundo grau) na Escola Naval, quando fatos estranhos começaram a lhe acontecer.
Ora ele assumia a estranha postura de um velho, falando coisas aparentemente desconexas, como se fosse outra pessoa e que havia vivido em outra época, e em outras ocasiões, sua forma física lembrava um felino lépido e desembaraçado que parecia conhecer todos os segredos da natureza, os animais e as plantas.
Aqueles acontecimentos logo chamaram a atenção de seus familiares, principalmente porque ele estava se preparando para seguir a carreira na Marinha como aluno oficial. A situação foi se agravando e os chamados “ataques” sucediam-se com mais intensidade. A família recorreu então ao médico Dr.
Epaminondas de Morais, também da família, diretor do Hospício de Vargem Grande e tio de Zélio.
Após examina-lo e observa-lo durante vários dias, reencaminhou-o à família, dizendo que a loucura não se enquadrava em nada do que ele havia conhecido, ponderando ainda, que melhor seria encaminha-lo a um padre, pois o garoto mais parecia estar endemoninhado. Como acontecia com quase todas as famílias
importantes na época, também havia entre eles um padre católico. Através desse sacerdote, tio de Zélio, foi realizado um exorcismo para livra-lo daqueles incômodos ataques.
Entretanto, nem esse, nem os dois outros exorcismos realizados posteriormente, inclusive com a participação de outros sacerdotes católicos, conseguiram dar à família Morais o tão desejado sossego,
pois as manifestações prosseguiram, apesar de tudo. A partir daí a família passou a correr atrás de toda e qualquer informação que lhe trouxesse a solução para seu filho querido.
Um dia, alguém sugeriu que isso era coisa de espiritismo e que o melhor era encaminha-lo à recém fundada Federação Kardecista de Niterói, município vizinho àquele em que residia a família Morais, ou seja, em São Gonçalo das Neves. A Federação era então presidida pelo Sr. José de Souza, chefe de um departamento na Marinha, chamado Toque Toque.
O jovem Zélio foi conduzido em 14 de novembro de 1908 à presença do Sr. José de Souza.
Estava em um daqueles chamados ataques, que nada mais eram que incorporações involuntárias.
De diferentes espíritos; e lá chegando, o Sr. José de Souza, médium vidente, interpelou o espírito manifestado no jovem Zélio e foi aproximadamente este o diálogo ocorrido:
Sr. José – Quem é você que ocupa o corpo deste jovem?
O espírito – Eu? Eu sou apenas um caboclo brasileiro.
Sr. José – Você se identifica como um caboclo, mas eu vejo em você restos de vestes clericais.
O espírito – O que você vê em mim são os restos de uma existência anterior. Fui padre, meu nome era Gabriel Malagrida e, acusado de bruxaria fui sacrificado na fogueira da Inquisição por haver previsto o terremoto que destruiu Lisboa em 1755. Mas, em minha última existência física, Deus concedeu-me o privilégio de nascer como um caboclo brasileiro.
Sr. José – E qual é o seu nome?
O espírito – Se é preciso que eu tenha um nome, digam que eu sou o Caboclo das 7 Encruzilhadas, pois para mim não existirão caminhos fechados. Venho trazer a Umbanda, uma religião que harmonizará as famílias e que há de perdurar até o final dos séculos.
No desenrolar dessa “entrevista”, entre muitas outras perguntas, o Sr. José de Souza teria perguntado se já não bastariam as religiões existentes e fez menção ao espiritismo então praticado, e, foram essas as palavras do Caboclo das 7 Encruzilhadas: -“Deus, em sua infinita bondade, estabeleceu na morte, o grande nivelador universal. Rico ou pobre, poderoso ou humilde, todos se tornam iguais na morte, mas vocês homens preconceituosos, não contentes em estabelecer diferenças entre os vivos, procuram levar essa mesma diferença até mesmo além da barreira da morte. Por que não podem nos visitar esses humildes trabalhadores do espaço, se apesar de não haverem sido pessoas importantes na terra, também trazem importantes mensagens do além? Por que não aos Caboclos e Preto-Velhos? Acaso não foram eles também filhos do mesmo Deus?”
A seguir, fez uma série de revelações sobre o que estava a espera da humanidade: “Esse mundo de iniqüidade, mais uma vez será varrido pela dor, pela ambição dos homens, pelo desrespeito às leis de
Deus... As mulheres perderão a honra e a vergonha, a vil moeda comprará caracteres e o próprio homem se tornará efeminado. Uma onda de sangue varrerá a Europa e quando todos acharem que o pior já foi atingido, uma outra onda de sangue, muito pior que a primeira, voltará a envolver a humanidade e um único engenho militar será capaz de destruir, em segundos, milhares de pessoas. O homem será vítima de sua própria máquina de destruição.”
Prosseguindo, diante do Sr. José de Souza, disse ainda o Caboclo das Sete Encruzilhadas: “Amanhã, na casa onde o meu aparelho mora, haverá uma mesa posta e toda e qualquer entidade que queira ou
precise se manifestar, independentemente daquilo que haja sido em vida, e todos serão ouvidos e nós aprenderemos com aqueles espíritos que souberem mais, e ensinaremos àqueles que souberem menos, e a nenhum viraremos as costas e nem diremos não, pois esta é a vontade do Pai.”
Sr. José – E que nome darão a esta igreja?
O caboclo - Tenda Nossa Senhora da Piedade, pois da mesma forma que Maria ampara nos braços o filho querido, também serão amparados os que socorrerem da Umbanda.
A denominação de “Tenda” foi justificada assim pelo Caboclo: Igreja, Templo, Loja dão um aspecto de superioridade enquanto que Tenda lembra uma casa humilde.
Dessa forma, em São Gonçalo das Neves, vizinho a Niterói, do outro lado da Baía da Guanabara, na sala de jantar da família Morais, um grupo de curiosos kardecistas compareceram no dia 15 de novembro de 1908 para ver como seriam estas incorporações. Para eles indesejáveis ou injustificadas.
O diálogo do Caboclo das 7 Encruzilhadas como passou a ser chamado, havia provocado muita especulação e alguns médiuns que haviam sido escorraçados das mesas kardecistas, por haverem
incorporado caboclos, crianças ou preto-velhos, se solidarizaram com aquele garoto que parecia não estar compreendendo o que lhe acontecia e que de repente se via como líder de um grupo religioso, obra essa que deveria durar a sua vida toda e que só terminaria com a sua morte, mas que suas filhas Zélia e Zilméia prosseguem com o mesmo afã.
A Tenda de Umbanda Nossa Senhora da Piedade existe até hoje. Seu patrono segue sendo o Caboclo das 7 Encruzilhadas. Seu endereço é Rua Dom Gerardo, nº 51- Rio de Janeiro – próximo ao cais das barcas de Niterói.
Zélio Fernandino de Morais-Caboclo das 7 encruzilhadas.
Distribuído por INSTITUTO CAMINHOS DO ORIENTE
“TENDA DE UMBANDA OGUM E OXALÁ”
www.institutocaminhosoriente.com
Este post é uma humilde homenagem de minha parte a esse Caboclo a quem nós umbandista devemos nossa religião.
- OKEY, CABOCLO DAS SETE ENCRUZILHADAS!
2 comentários:
Bem estilizados os seus blogs. Muito bacana. Gostei muito deste.Parabens!
Um abraco!
Grata, irmãonzinho!
Bom v^-lo por aqui.
Beijocas
Postar um comentário